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Ilha do Pico - Majestade dos Açores

Majestade do Pico

"Ilha verde com rebordos anegrados e remate de cinza. Ilha que consubstancia em si o ideal do belo ora suave, ora agreste. Ilha que se desdobra em cambiantes paisagísticos, os mais cativantes, os mais harmoniosos, os mais excelsos.

Ilha de «mistérios», com costas vincadamente recortadas, abrindo-se para o mar em arcos, em grutas, em pontas, em ilhéus. «Mistérios» de lava que, escorrendo, transformaram o terrível num capricho sublime.

Ilha que nós sentimos com a profundeza do mais cálido sentimento, com uma ânsia perdida entre ternura e a paixão. Amando-a, estamos a render preito ao Criador por ter ofertado à humanidade tão prodigiosa benesse.

Ilha de flagrante meiguice que, aqui e ali, por todo o lado, se patenteia. E de sedutora fascinação que brota do seu corpo ondulado.

A ridência da Calheta de Nesquim, a graça de Santa Cruz das Ribeiras, o arroubo dos Arcos do Cachorro, a esbelteza da Prainha do Norte, a pulcritude da Piedade, especialmente no sítio da Manhenha, o esplendor das Lajes, a doçura de S. João. Ilha que se alinda a preceito, roupagens verdes debruadas a preto, de forma mais incisiva, entre S. Mateus e a Madalena.

Ilha que oferece o deslumbramento de S. Roque, visto, cá de cima, de S. Miguel Arcanjo. Ilha que mostra a fantasmagoria arrebatante da Terra Alta. Ilha que nos faz tremer de frémito, que nos sacode de júbilo, que nos agite de emoção.

 

Ilha singular, quer pelo seu aspeto tão característico, quer pela sua imponência, onde não há arrogância, mas humildade e abnegação.
Ilha onde as casas proliferam em amontoados, encostadas à orla marítima. E enseadas e barcos e pescadores…

                                                                                       

Da estrada de volta à ilha, bermas arrebicadas com flores, a paisagem espraia-se para cima e para baixo. Para cima, o verdejar das pastagens, que rematam em ondulações suaves ou no sopé de cabeços recamados de vegetação tão luxuriante quão primitiva. Para baixo, a limpidez do mar e o contraste do casario, ora alvo, ora escuro, irmanando-se, porém, no mesmo sentido da perpetuidade de usos ancestrais.

O feitiço da ilha aferra-se, com maior acutilância, ao deixar-se a estrada principal, variando-se pelos ramais que descem, suavemente, até junto da beira-mar.

O Pico, todo ele, é um grandioso jardim recheado de canteiros. Uns com flores. Outros com vinha, com legumes, com árvores frutíferas.
Desse imenso jardim, numa mistura airosa de verdes e cinza, brota um hino de alegria flamejante que grita, que entontece, que entusiasma, que emociona, que reza!

O Arquipélago dos Açores

Nove ilhas e inúmeros ilhéus1 formam o arquipélago dos Açores que, naturalmente, se subdivide em três grupos:

  • Grupo Oriental: Santa Maria (97 km2 de superfície), São Miguel (747 km2) e Formigas2.
  • Grupo Central: Terceira (397 km2), Graciosa (61 km2), São Jorge (238 km2), Pico (444 km2) e Faial (172 km2).
  • Grupo Ocidental: Corvo (17 km2) e Flores (143 km2).

À volta de todas as ilhas se formaram ilhéus, merecendo destaque: Ilhéu de Vila Franca (S. Miguel), da Caloura (S. Miguel), dos Mosteiros (S.Miguel), das Cabras (Terceira), da Madalena (Pico), do Topo (S.Jorge), do Rosto do Cão (S.Miguel), do Romeiro (Santa Maria), etc.

Os oito ilhéus das Formigas, situados a norte de Santa Maria, não passam de penedos quase rasantes ao mar e, por isso, perigosos para a navegação de ser um centro piscatório ímpar. 

O arquipélago recebeu o nome de «Açores» pela grande quantidade de aves de rapina (milhafres) com que os marinheiros, enviados ao encontro das ilhas, por ordem do Infante D. Henrique, aí depararam, julgando estar diante do autêntico açor.

À época do seu reencontro, as ilhas apresentavam-se virgens, isto é, sem o mínimo vestígio de presença humana e desprovidas de animais, excetuando aves de várias espécies. Ao invés, a vegetação era frondosa, havendo, na maioria, densas zonas florestais.

 

Todas a ilhas do arquipélago são de formação vulcânica, origem que está bem patente e que relega, para o reino da fantasia, a lendária Atlântida. As de formação mais antiga e, por conseguinte, mais consolidadas, são as ilhas das Flores, do Corvo e de Santa Maria.

 

O arquipélago é credenciado pela exuberância de cada uma das suas ilhas, tão diferentes uma das outras, embora com múltiplos pontos de contato e de afinidades.

Goza de clima temperado, más húmido, devido à influência exercida pela corrente quente do Golfo do México. A amplitude térmica vária entre 14º e 22º, só, esporadicamente, ultrapassando tais valores.

Tem ainda a particularidade de usufruir de uma certa inconstância no tempo, chegando a fazer, durante o mesmo dia, as quatro estações do ano, expressão muito em voga entre os seus habitantes.

A instabilidade é uma das caraterísticas mais salientes do clima açoriano, fazendo suceder diversos estados de tempo em curtos períodos. (Caetano Valadão Serpa, em «A Gente dos Açores»).

Notável é a rapidez com um tempo de borrasca, em poucas horas, altera para um período de céu límpido e suave; notável é a facilidade com que um aguaceiro se despenha para logo voltar ao sol radiante; notável é a forma como o nevoeiro se adensa, em poucos minutos, em determinados lugares, escondendo-se por completo. 

A esta instabilidade climatérica, os Açores devem a maior da sua riqueza, onde os pastos se conservam sempre verdes e a criação do gado (com as indústrias daí derivadas) é a primordial fonte de receita." 

A Ilha do Pico no Complexo Açoriano

É a ilha do Pico a segunda em superfície (444 km2), situando-se, de permeio, entre as ilhas de S. Jorge e do Faial. São portanto, três as ilhas que fazem parte do mesmo complexo paisagístico.

A enorme altitude do cone do Pico (2351 metros) está sempre presente na panorâmica das citadas, como eu fazendo parte integrante das mesmas. As distâncias entre esse conjunto são diminutas, tomando em consideração os pontos mais aproximados (Faial/Pico = 4,5 milhas; Pico/S. Jorge = 11milhas; Faial/S. Jorge = 15 milhas).

A montanha do Pico serve de barómetro para si e para as ilhas vizinhas, adivinhando-se o tempo pela posição das nuvens. Especialmente para o Faial (a ilha irmã pela aproximação, não pelas características da paisagem), o Pico tem uma enorme importância, defendendo-a de ventos agrestes.

No conjunto com as demais ilhas do arquipélago, o Pico tem uma paisagem diferente, bem característica pelos seus abrigos de pedra tostada e negra a protegerem a vinha e fruteiras. Pontos de contato, com a idêntica singularidade, deparam-se em S. Miguel (Caloura) e na Terceira (Porto Martins, Serretinha e Biscoitos).

 

Todavia, o Pico é algo de sublime no meio do arquipélago. É algo que atrai e entusiasma. É, de todas, a ilha mais peculiar.

 

É uma das mais belas parcelas do nosso arquipélago, onde os «mistérios» de um Ser Superior, se intercalam com os esforços do Homem, onde aos abismos sobre o mar se sucede o bucolismo das encostas verdejantes, onde as povoações semelham rebanhos pacíficos e as extensões queimadas nos patenteiam o milagre de quantas vinhas, de quantas faias e figueiras, de quantas espécies, em suma, irrompem dos biscoitos… (Carreiro da Costa).

No complexo açoriano, nãos se podem, porém, esquecer outras formas de beleza bem patentes nas ilhas de S. Miguel, Flores, S. Jorge, Terceira, Faial, etc. Nem deixar de citar a cativante costa norte de Santa Maria, a ridência suave da Graciosa e o caraterístico Corvo, a quem alguém já cognominou de irmão do Pico, por também ele servir de barómetro aos habitantes das Flores e aos da própria ilha.

Na verdade, a beleza do arquipélago patenteia-se em cada ilha, com encantos tão diferenciados quão insignes. Mas, a graça do Pico é mais insinuante, mais estigmatizada, pois adveio do sofrimento, da angústia, do sacríficio. É, portanto, uma formosura natural que se alia a uma outra metafísica, que o Ser Superior derramou por lá em jeito de recompensa."

Autor - Guido Monterey